segunda-feira, 22 de outubro de 2012

E a aeromoça continua um avião

Ele não é colunista convidado porque infelizmente não o conheço para convidá-lo.
Li este texto no facebook - tema do próximo post - e, como todas as aeromoças, fiquei tão lisonjeada com a homenagem que resolvi publicá-la.
Com vocês, a primorosa ode de Fabrício Carpinejar
Boa leitura!
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"O amigo Paulo Sant`Ana escreveu que as aeromoças entraram em decadência. Eu vejo o contrário: elas são as únicas que mantiveram a elegância apesar do sucateamento das condições de voo.
Formam um oásis de delicadeza. Não desistem de contrariar as turbulências com o riso educado (quanta malícia para se ter um riso ingênuo!).
As companhias aéreas reduziram os custos, eliminaram o conforto, encaixotaram os clientes em acomodações perversamente pequenas, só a aeromoça ainda age como diva. É uma solitária imperatriz das alturas, de alegria certa como rima em hino religioso.
Ainda passeia pelo corredor vermelho da aeronave como se as poltronas não fossem apertadas, como se ainda houvesse um lanche a servir.
Sua voz é alta, clara, soletrada, para não existir dúvidas de sua atenção. É uma fonoaudióloga à paisana. Escuta com o rosto. Coloca o rosto para frente, antecipando a surdez de nossa velhice, sem medo nenhum da hostilidade e da reclamação.
A aeromoça continua linda, como nos tempos áureos da Varig e da Vasp. Conduz sua mala de rodinhas com leveza de um vestido em seu próprio corpo.
Não rebola, ondula. Não esbarra, desliza.
Nunca está imprecisa, nunca se afasta do batom e do lápis. Tem a tranquilidade sensual de quem se arrumou de melhor maneira possível.
A aviação faliu, menos a figura da comissária de bordo. Os aeroportos pioraram, menos a figura da comissária de bordo.
Ela conserva a aristocracia do coque, a nobreza da trança, a disciplina do cabelo preso. Suas unhas estarão pintadas, as cutículas feitas, o crachá à vista. Algumas vezes extrapola e nos surpreende com boinas inclinadas, arrancando suspiros nas escadas rolantes.
Aeromoça não mudou. Não há caspa em seus ombros. Não há desalinho e ranço em seu uniforme. Perfuma a ventilação do nosso sono repentino, do nosso cansaço de filas e atrasos.
Transforma os procedimentos de emergência em balé. Não perco o espetáculo por nada. Já vi centenas de vezes, mas não canso de assistir o corcovado das portas de emergência. Para um asmático como eu, é tocante o aviso da queda da máscara de oxigênio.
A aeromoça continua linda, caminha com as costas retas, jamais observando o chão. É a resistência da beleza. A mesma saia plissada de colegial, o mesmo lenço no pescoço de Marilyn Monroe, as mesmas meias de nylon.
Avança com seu orgulho silencioso, inquebrantável, e cumpre todas as conexões e pontes aéreas de meu olhar."


Um comentário:

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